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Fonte: Valor Econômico Cristiane Perini Lucchesi
A atuação dos governos pode apenas amortecer o choque, mas não vai impedir que ele aconteça.
A inadimplência das empresas não-financeiras teve uma aceleração no último trimestre do ano passado no mundo todo e vai crescer ainda mais neste primeiro semestre, que será o epicentro da crise para o setor corporativo, na visão da Coface, a maior seguradora de crédito à exportação do mundo, do grupo francês Natixis. 'A atuação dos governos pode apenas amortecer o choque, mas não vai impedir que ele aconteça', diz Yves Zlotowski, economista-chefe da Coface. 'Há sempre um processo de 'seleção natural' no meio da crise e você não tem como evitar falências e inadimplência', afirma, em entrevista ao Valor.
Divulgação
Até a própria Coface, que avalia constantemente o risco de crédito de 41 milhões de empresas não-financeiras, admite ter subestimado o tamanho do impacto da crise nessas companhias. As expectativas eram de um aumento de 30% no índice de não-pagamento em 2008, mas o que acabou se verificando foi uma elevação de 47% nos onze primeiros meses do ano passado. Por isso, para a Coface, a crise atual é comparável à do início dos anos 90, quando o aumento dos não-pagamentos chegou a 50%, segundo Zlotowski.
O primeiro setor a ser atingido foi obviamente o de construção civil e todos os segmentos relacionados, como por exemplo material de construção, lembra ele. 'Começou como uma crise mais do setor de serviços e agora está impactando o setor industrial e os produtores de commodities', afirma.
De acordo com o economista, o setor automotivo é um exemplo. Nos Estados Unidos, as montadoras já vinham em crise, mas na Europa e no Japão o segmento crescia antes do aperto abrupto no crédito e queda de vendas. 'A crise agora atingiu também o setor de telefonia no Japão, que era muito forte, muito estimulado pelas exportações', comenta. Há alguns setores que continuam preservados, pelo menos por enquanto, de acordo com ele, como o setor farmacêutico e, em alguns países, a indústria de computadores.
Para Zlotowski, as empresas mais atingidas neste ano continuarão a ser as que tiveram o maior aumento na inadimplência em 2009. São as companhias da Espanha, que registraram elevação de 131% no índice de não-pagamentos, dos Estados Unidos, com 66% de aumento, da Grã-Bretanha, com 64%, e da Irlanda, com 70%. 'O processo de estouro da bolha continua nesses países e por isso nós acreditamos que a situação vai continuar a se deteriorar', afirmou Zlotowski. 'Talvez nós vejamos alguma luz no fim do túnel no último trimestre de 2009', diz ele.
No seu cenário mais provável, os Estados Unidos voltarão a crescer no último trimestre de 2009, registrando uma queda de 0,9% no Produto Interno Bruto no total neste ano. Na Europa, haverá queda de 1% no PIB no primeiro trimestre e crescimento zero no segundo. 'O problema depois do grande choque de 2008 e de 2009, principalmente no primeiro semestre, é como você vai sair disso', afirma. Ele não considera o mais provável, mas vê riscos de um longo período de crescimento zero nos EUA, como aconteceu no Japão nos anos 90. 'No Japão, você teve 10 anos de crescimento negativo no crédito por causa de um longo período de desalavancagem', comenta.
Para ele, o mais difícil é saber qual será o nível de desalavancagem ainda necessária para o setor bancário hoje. 'Dessa forma, não sabemos quão doloroso e poderoso será o processo de desalavancagem para as empresas não-financeiras', afirma. 'Se não tivermos uma nova Lehman Brothers, acho que poderemos continuar sem uma depressão', diz. Segundo ele, 'dívida do consumidor, dívida das empresas, nós já conhecemos isso antes, como isso provoca uma recessão, isso não é novo'. O que é novo, no seu entender, 'é a crise sistêmica nos bancos de alguns dos maiores países'.
Ele lembra, no entanto, que no Japão, durante os anos 90, o governo ficou muito relutante em recapitalizar os bancos e por isso o processo da recuperação foi muito devagar. 'Agora, na Europa e nos Estados Unidos, as autoridades fizeram aportes massivos e essa é uma forma de evitar dez anos de aperto no crédito', afirma.
Neste momento, comenta ele, até mesmo os Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) foram atingidos. Mas, para Zlotowski, as empresas do Brasil são comparativamente menos vulneráveis à contração do crédito em dólar do que em outros países. 'No Brasil houve um processo de aprendizagem com relação às crises anteriores, vocês sabem que a taxa de câmbio pode ser algo volátil, letal, muito perigoso', diz. 'Dessa forma, as empresas tiveram a clareza de que precisavam reduzir sua vulnerabilidade à taxa de câmbio', comenta, para completar que o mesmo aconteceu com o governo brasileiro, que teve a participação da dívida externa reduzida em relação à dívida total. Segundo ele, as empresas russas, por exemplo, são bem mais dependentes da dívida externa, pois essa dívida aumentou 145% desde 2005, na comparação com o aumento de 65% da dívida externa das empresas brasileiras.
Ele lembra que os juros altos deixam bastante espaço de atuação para o Banco Central no Brasil e que grande parte das empresas no país sempre foram acostumadas a se autofinanciar, devido ao nível baixo do crédito em relação ao PIB. Zlotowski diz, no entanto, que cometeu um erro ao pensar que em uma economia como o Brasil, no qual o crédito representa só 40% do PIB, um aperto não teria um impacto tão forte. 'Eu subestimei a importância que o aumento no crédito ao consumo vinha tendo no crescimento da economia do país', afirma. Ele comenta ainda que algumas empresas 'brincaram com instrumentos financeiros um pouco arriscados', referindo-se aos derivativos de câmbio, mas considera que 'isso não tem nada a ver com os fundamentos da economia'.
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